quarta-feira, 28 de abril de 2010

Em busca de

O astro cinzento afogava a manhã. Não existiam árvores nem qualquer outro sinal da Natureza. O ar viciado respirava-se com dificuldade, a ausência de sorrisos tornava tudo ainda mais deprimente. O sol queimava e não havia ninguém na rua. Apenas uma mulher alta, de cabelos e olhos negros com um andar cansado, ocupava aquelas ruas despidas de tudo. A roupa que trazia definia detalhadamente o seu corpo esquelético, estava suja e gasta e a respiração ofegante era resultado de uma longa e dolorosa caminhada em busca de alimento.

Deixou os dois filhos inseguros dentro de uma robusta caixa de metal, tapados com trapos velhos e restos de alimentos que os vermes se tinham encarregue de decompor. Entrou numa loja que havia sido saqueada e procurou por entre os escombros, migalhas que matassem a fome ás crianças desprotegidas. As mãos grandes, meio ensanguentadas, tinham uma força desesperada. O indicador esquerdo tocou algo menos áspero que uma pedra. Desviou tudo o que a impedia de lhe chegar, e a sua mão trazia com ela um quarto de pão. Nasceu nela uma felicidade interior, embora os lábios secos e gretados não se movessem. Tomou o caminho de volta, passadas duas horas as pernas esgotaram toda a sua energia. Caiu sobre o alcatrão escaldante que lhe queimou o rosto. Acordo pouco depois, levantou-se pesarosamente e caminhou. Sabia que tinha de chegar aos seus filhos rapidamente, os frágeis organismos não suportariam os pedidos dolorosos do estômago por muito mais tempo. Há quase três dias que os tinha deixado com um beijo suave nas bochechas ásperas e encardidas. Os últimos metros, percorreu-os a correr com toda a velocidade que podia. Abriu a pesada tampa do caixote e lá estavam eles, pálidos e de olhar fixo e vazio. Dividiu o pão duro e deu a cada um, uma metade. Aquelas bocas pequeninas devoraram-no num abrir e fechar de olhos, e depois de engolirem em seco, olharam a mãe pedindo por mais.

A impotência que sentiu fê-la chorar, as lágrimas lavaram-lhe o rosto. Puxou contra o seu colo as duas pequenas cabeças e apertou-os carinhosamente. Continuavam esfomeados, e choraram também.

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