Primeiro momento
Alguém que está num espaço branco. Não são claras as noções de altura, largura e profundidade. À medida que anda, sente uma força que o puxa no sentido centrípeto, de maneira que não consegue libertar-se de uma espécie de corda que o prende ao centro. Vai andando em círculo, ou quase, conclui. De facto, não pode parar.
Enquanto caminha, repara atento no que o rodeia. Por vezes, e por estar a andar em círculos, tem de virar a cabeça para trás, pelo lado direito – tal é a curiosidade – e depois olhar pelo lado esquerdo, retomando a observação no exacto ponto onde tinha sido interrompida pelo virar da cabeça. Circula em volta de algo a uma distância que vai diminuindo lentamente à medida que o tempo passa. Descobriu isto quando começou a estabelecer pontos de referência suficientes para deduzir que a distância ao centro estava a diminuir.
É especulação pura, aquilo que tenta concluir acerca de outras pessoas que, como ele, andam em círculos ou que, por outro lado, andam livremente e conseguem tocar nas outras pessoas. Imagina que, provavelmente, também um dia deixará de andar às voltas. Deixará de repelir os outros e começará, quem sabe, a puxá-los, a atraí-los para si, ou até entrar nos círculos deles. Começou a distinguir cores nos outros, rosa e azul.
Não compreende como conseguem alguns andar par a par. Já conseguiu manter conversas com outros que passaram por ele, mas nunca tinha conseguido acompanhar ninguém, mesmo que, por vezes, vontade não faltasse, um entusiasmo interior que começava a sentir. Conseguia até libertar-se por momentos, mas rapidamente voltava ao seu trajecto PI x diâmetro.
Não desanimava, pois via nestas pequenas evoluções um sinal positivo.
Segundo momento
O segundo momento na vida de uma pessoa dá-se quando toca no centro e se liberta. Sente uma força interior, uma certa incerteza. A pessoa deixa de se puxar para ela própria para passar a atrair outros ou ser atraído por eles. Consegue tocar-lhes, partilhar com eles a vida dos círculos e rirem-se disso. Depois é o momento em que em que unem forças e seguem o que a força de cada um lhes diz. Acham-se mais sabedores. É natural.
Têm filhos que hão-de passar também pelo primeiro momento e chegar ao segundo momento, tal como eles chegaram. Nesta altura já os espaços não são brancos, já são mais claras as noções de altura, largura e profundidade. Conhecem-se a eles próprios, por dentro e por fora. Toda esta conversa é comparável aos ímanes, se quiserem. Só que estes ímanes perdem e ganham força em ciclos irregulares, é o amor.
Terceiro momento
O tempo passa. Os ímanes existem, mas não se atraem, nem se afastam. Ficam naquele equilíbrio latente de forças. Quase como dois lutadores transpirados numa arena naqueles instantes das lutas em que não há movimento. Os lutadores estão agarrados um ao outro, há uma força de parte a parte, uma espera por algo novo, uma tensão.
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