quarta-feira, 5 de maio de 2010

Na vida e no caixão sou isto: nada !!

Solto incontroláveis gargalhadas dentro deste caixão rasca onde me encaixotaram. Acordei subitamente imobilizado, a única coisa que consigo mover são os meus aberrantes pensamentos. Rio-me sobretudo de mim próprio… mas também da inconsciência desta meia dúzia de bichos que me começaram a morder e que me fizeram despertar do meu descanso eterno. Um riso de absoluta clarividência: estou morto, há muito, muito tempo, mas estou neste caixão há pouquíssimo tempo. Ainda sinto o cheiro nauseabundo do bagaço da outra noite, da noite das minhas frustrações, dos meus fracassos, das minhas inglórias, das minhas derrotas… Enfim, a noite de mim próprio. Só agora, neste caixão sujo de mim, consigo perceber aquilo que verdadeiramente me matou. Ainda me sinto bêbado, mas assumo a responsabilidade da minha clarividência, do rigor da minha auto-analise:

- Morri! Morri no preciso dia em que disse: eu vou por ai!!, gritei eu para o vazio de mim próprio.

- Morri quando decidi não decidir, quando decidi desacreditar no único e exclusivo estado que me conseguiria manter vivo: o sonho, eu próprio!

E aqui estou pronto para descobrir aquilo que não vou encontrar, e para acreditar naquilo que sei que nunca conseguirei fazer. Todos estes bichos estultos conseguem ser mais estultos que eu. Comem apenas restos de um pedaço de carne que não existe, que nunca existiu, que nunca existirá, mas que ainda assim os vai consumir. Comem restos de uma carne usada, que se perdeu. Comem restos de um corpo vazio que nunca existiu à luz da realidade. Rio-me porque julgam estar a alimentar-se, não sabendo que estão simplesmente a suicidar-se fazendo uso de um corpo inerte.

O que fui? O que sou? O que serei? Nada!

Não deixo nada, apenas imbecilidades que não são mais que nada. Não fui nada, apenas um vazio móvel que preencheu espaços desumanizados. Não existirei amanhã, porque apenas fui lixo numa lixeira sedenta de sangue e crueldade. Se voltasse atrás no tempo não seria nada mais que isto, e morreria de novo no dia em que disse “eu vou por ai”, no dia em que decidi deixar de decidir e que me ofereci ao vazio. Porque não há volta a dar: eu sou, fui e serei isto: um nada num Mundo cheio de nadas.
Assim continuarei neste caixão sedento de tudo o que quis ser, de tudo o que nunca fui, de tudo o que nunca consegui ser. Continuarei sempre nesta caixão fechado a sete chaves. E mesmo que mo abram nunca sairei dele: não quero consumir mais este Mundo sujo!!

… Afinal de contas estou morto e para sempre!

Sem comentários:

Enviar um comentário